sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

História da semana #83: Triste final

Na história da humanidade nós encontramos muitas histórias de redenção, conversão, superação, enfim, finais felizes. Mas também temos histórias tristes. Finais que nos revoltam, nos indagam. Há também as histórias com finais felizes e tristes ao mesmo tempo. Um lado sai bem o outro mal, para alguns a justiça prevalece, mas para outros o errado sobressai o certo. O dilúvio, para muitos uma lenda, para outros um acontecimento verídico que mudou o mundo, é uma dessas histórias histórias com finais felizes e tristes. Noé e sua família se salvaram, mas outros sofreram as consequências do pecado.
Meleque era um jovem como tantos outros. Como os jovens de hoje, era normal ele querer descobrir as coisas, dúvidas surgiam em sua mente quase sempre, ele queria conhecer o mundo, o que este podia oferecer. A natureza edênica, pouco havia sofrido mudanças desde a queda, Meleque a conhecia, passava horas abaixo das gigantescas árvores das planícies onde morava, seja estudando, refletindo sobre os dilemas da vida, conversando com os amigos, fazendo desenhos inspirados nas paisagens que fazia, cantarolando músicas e até namorando, ele não se cansava disso, passar seu tempo olhando aquela beleza inimaginável. Conhecia aquelas árvores e flores como a palma de sua mão, podia se aventurar a fundo nas florestas, mas não se perdia, herança de sua infância e juventude em que ele e o seu pai passavam o tempo explorando a rica flora do lugar e meditando nas obras do Criador. Mas adorar a Deus era passado. Desde que cresceu e viu as oportunidades que a vida oferecia ele abandonou seu Deus. Era um jovem inteligente, não era desses baderneiros e glutões que passavam horas caçoando dos religiosos, ele só ria de Noé, todos tiravam um sarrinho do velho profeta, o mundo acabar numa inundação? Jamais havia chovido e Meleque era um jovem racional, as coisas sem sentido não tinham espaço em sua vida. Mas, como disse, dúvidas surgiam na cabeça de Meleque. Seria possível que existisse Deus, seria esse Deus alguém que se importava com o ser humano ou apenas alguém jogando um jogo de criar planetas? Se não existe Deus, como ele e seus amigos criam, quem criara a imensa beleza admirada diariamente por ele?
Certo dia, em suas horas de reflexão ao pé de uma árvore, rabiscando o rosto de sua amada, ele foi interrompido por um som de passos. De repente uma voz calma o surpreende:
- Você vem sempre aqui?
- Sim- respondeu Meleque.
- Eu sou Jafé.
- Meleque.
- É bom poder descansar hoje, não?
- Na verdade eu não trabalho, e você o que faz?
- Sou construtor. Trabalho todo dia, menos hoje.
- Não me diga que é sabatista?
- Sou.
- Conhece Noé?
- Sim, é meu pai.
Meleque se surpreendeu, ficou com vontade de insultar o homem, mas a gentileza de seu novo amigo não deixava agir grosseiramente.
- Minha família também guarda o sábado.- disse Meleque.
- E você?
- É uma longa história.
Os dois passaram horas conversando a sombra da árvore. Falaram sobre tudo, inclusive sobre a fé de Jafé e a racionalidade de Meleque. Se conheceram, Meleque descobriu algumas coisas interessantes sobre a arca. Dali em diante eles passaram a se ver constantemente, Meleque apresentou seus amigos a Jafé e vice-versa, Meleque convidava Jafé para festas, Jafé o convidava para cultos na natureza, tinham suas diferenças, mas se aceitavam muito bem.
Certo dia, Meleque, em seus momentos de inquietação sobre Deus resolveu aceitar um convite do amigo, foi a uma reunião, lá hinos de sua infância foram recordados, a igreja era predominada por velhos, mas havia alguns jovens, como Jafé e sua noiva. Ele gostou, naquela tarde almoçou com Noé e sua família, no sábado seguinte, a mesma rotina, até que os boatos entre seus amigos começaram a surgir: Meleque se converteu.
Um dia, ao negar um convite para uma festa, seu amigo e ele discutiram:
- Você é um sabatista.- disse o amigo.
Mais tarde os amigos começaram a evitá-lo, depois a namorada colocou um ultimato: Ela ou Deus. As dúvidas voltaram a surgir na cabaça do jovem, a saudade das festas o incomodava, ele voltou a se afastar de Deus. Jafé notou isso, Um dia, ao pé daquela mesma árvore, Os dois se encontraram, as palavras de Meleque foram fortes:
- Não vou mais aos cultos, não quero mais saber de Deus, não me procure mais.
Aquelas palavras feriram Jafé, mas também feriram Meleque, ele não queria largar o amigo e a fé, mas também não abria mão das festas e dos amigos, fez sua escolha. Com o tempo percebeu que só poderia tirar aquela dor no coração nas festas, se entregou a bebida e imoralidade sexual, passou a caçoar de Noé e seus filhos, aquele jovem interessado se tornou um inimigo.

Alguns anos depois, com a arca já pronta, os animais lá dentro, junto de Noé e sua família, uma multidão ria do lado de fora, se preparavam para destruir a arca. Jafé olhava pela janelinha, via Meleque, outrora seu amigo, liderando as chacotas. "Se ele renunciasse aos prazeres mundanos estaria aqui comigo." dizia o filho de Noé. De repente o céu escureceu, ventos fortes começaram a soprar, gotas começaram a cair cada vez mais fortes, a multidão se dispersava, uma lagrima escorreu na face de Jafé. Meleque se viu impotente, não adiantava fazer nada agora, correu, mas as águas subiam cada vez mais, ele gritava palavras ofensivas a Deus, não tinha mais o que fazer, correu, nadou, entrou na floresta, tentou escalar uma árvore em vão,  sentou-se ao pé da árvore e chorou por sua impotência.
Alguns minutos depois a água o alcançou, ele não fez nada. Morreu afogado, se ao menos tivesse aberto mão de algumas coisas, poderia ter se salvado, teve mil e uma oportunidades de aceitar a Deus, mas preferiu as festas e prazeres. Temos que fazer escolhas, abrir mão de certas coisas, em breve Deus destruíra a Terra e só os justos se salvarão, cabe a você decidir de que lado você está.
   

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